1 de Janeiro 2019
Delicada Engenharia para Aconchegar o Futuro
A mesma aparente fragilidade de um corpo de bailarina que, assim que evolui no palco, revela toda a sua energia transbordante. E desconcertante. Até a delicadeza do gesto e o som contido das palavras vêm sublinhar essa aparência. Só que, nem um minuto corrido do início da conversa, já Isabel Sá, 38 anos, brigantina ou bragançana – duas palavras para os naturais de Bragança –, já a nossa anfitriã, dizíamos, se revela um torvelinho cada vez mais rodopiante, puxando pela nossa melhor atenção às suas ideias, aos seus sonhos, aos seus desassossegos... Quando Isabel apresenta ou argumenta o que quer que seja, os olhos e as mãos iluminam e fixam uma capacidade invulgar para descrever a essência, o alcance e as possibilidades dos vários projectos que vão desinquietando esta jovem engenheira do ambiente, ligada de corpo e alma, nos últimos onze anos, à conservação da natureza e à preservação de tradições em meio rural, através da Associação ALDEIA. “A minha função é, no fundo, fazer desenvolvimento em meio rural, captando a atenção das pessoas – gentes locais e de outros lugares – convidando as primeiras a olhar para os seus recursos e a tentarem ser auto-suficientes a partir do seu território”.
O que nos traz a Bragança é, sobretudo, desfiar com Isabel o seu projecto LHANA, vencedor do Prémio Empreendedorismo e Inovação Crédito Agrícola 2018, na categoria “Projecto promovido por Associado CA”. Até há três anos, Isabel viveu oito anos em Duas Igrejas, terras de Miranda do Douro. Ali trabalhou noutro projecto muito interessante [O Lobo e a Aldeia] com a missão de mediar o conflito entre o lobo e a pastorícia. “Como conservacionista, interessa-me muito a presença e a preservação do lobo ibérico, mas, ao mesmo tempo, é indispensável conservar os pastores e as raças de ovelhas, pois são eles que cuidam e valorizam igualmente a nossa paisagem”.
Neste cenário onde a lã ainda é muito desaproveitada e os pastores quase nunca obtêm retorno da tosquia das ovelhas, Isabel decidiu apostar. Ou seja, investir no aproveitamento da lã, inicialmente de ovelhas da raça Churra Galega Mirandesa (seguir-se-á a Churra Badana) comprada a um preço justo e, a partir daí, fazendo renascer artes e ofícios também eles em vias de extinção, como a fiação manual, envolvendo a colaboração de três experientes fiadeiras locais, a tecelagem e as malhas. O portefólio é para já constituído por lãs (tingidas pela própria Isabel, num processo de tinturaria natural, com recurso a plantas, líquenes e cogumelos), sabonetes esfoliantes cobertos de lã cardada e feltrada e, finalmente, estojos-kit com instruções bilingue(português e mirandês) para iniciação à fiação manual e às malhas.
LHANA é isto mesmo. Nome de projecto e marca que tem tudo a ver com Isabel. Uma jovem portuguesa e transmontana que não pára de magicar, de pensar, de fazer coisas… Outras coisas, como é o caso do mel. Tudo em nome do mundo rural e da biodiversidade, de tantos recursos e tradições que assumem valor inestimável, acima de tudo quando é tempo de tecer as malhas que pespontam o caminho às novas gerações em Portugal.