“Conhecendo [muito] bem a realidade dos territórios onde a presença do Banco é mais significativa, sei que os nossos Clientes têm a percepção de que o CA lhes pertence. Aceito, de bom grado, esse sentimento natural. Nada que se possa confundir com apropriação ilegítima ou algo susceptível de, aqui e ali, conflituar com o pensamento de um Associado – nada disso.
Falamos de outra dimensão. A de pertencermos com autenticidade e de corpo e alma a esta Instituição. Por outro lado, gostaria de confessar o muito respeito que tenho por quem vive e resiste em zonas quase abandonadas, espelho da assimetria profunda entre o Litoral e o Interior, entre o urbano e o rural. São notáveis as pessoas que conseguem resistir nesses territórios. E isso é muito mais do que resiliência”. É o Crédito Agrícola, aqui retratado pelo seu presidente, Licínio Pina
Que leitura faz de uma eleição sufragada pela esmagadora maioria das CCAM, legitimando, num registo sem precedentes, o seu quarto mandato como presidente do Grupo CA?
As Caixas deram-nos, de facto, um capital de confiança em votação recorde na história do Crédito Agrícola. Estou, não escondo, muito satisfeito, porque esta resposta, este voto, é o reconhecimento expresso e inequívoco de que estamos no rumo certo. Desde 2013 que vimos trabalhando na construção e na projecção da imagem do Crédito Agrícola para o exterior. Na minha modesta opinião, esse trabalho tem sido muito bem executado, muito bem conseguido e – no topo dos nossos objectivos neste capítulo – tem diferenciado o Crédito Agrícola, não exclusivamente como Instituição bancária posicionada para servir os agricultores ou, apenas, vocacionada para a agricultura, mas, definitivamente, um Banco universal, robusto, capitalizado, cuidando de dotar os nossos Clientes de serviços de excelência. Acresce que, nos últimos anos, o Crédito Agrícola tem conseguido munir-se de ferramentas e soluções informáticas de vanguar
da, que disponibilizamos à nossa Rede, aos nossos Colaboradores, eles que na prática são os verdadeiros autores do sucesso do Grupo – eu sou, apenas, o presidente...
O timoneiro…
É uma imagem em que, numa certa perspectiva, me revejo, mas que não pode nunca desligar--se das competências e do desempenho de uma vasta equipa, que, embora renovada para o novo triénio, mantém a maioria dos seus administradores executivos. Ainda sobre a confiança dada pelas Caixas à Administração a que presido, leio nesse voto histórico, tanto um claríssimo sinal para continuarmos, como uma exortação: “contem connosco”! A partir daí, eu, como presidente, conto com as pessoas das Caixas, com as suas Administrações, participando, na primeira linha desta manifestação de unidade, de consolidação e ao mesmo tempo de resiliência para enfrentar os grandes desafios que o futuro nos reserva. É avisado sublinhar que estamos actualmente perante um cenário geopolítico muito difícil e em contextos macroeconómicos muito disruptivos. Tudo isto vai exigir mais de nós, sendo certo que só conseguiremos dar a melhor resposta se estivermos todos unidos, como ficou demonstrado em votação.
Quando passa em revista o essencial dos seus três mandatos anteriores, que notas relevam da obra feita, dos desafios superados?
Várias iniciativas e decisões de gestão marcaram, de modo indelével, os três últimos mandatos, e foram fundamentais para o caminho percorrido e a meta que atingimos em 2021. O primeiro mandato foi, essencialmente, virado para a resolução de um conjunto alargado de dificuldades que encontrámos – e que tivemos de assumir. Em boa verdade, eu diria que assumimos de forma brilhante, tendo resolvido todas essas dificuldades para conferir robustez à Caixa Central e aos órgãos e unidades centrais do Grupo. O que me interpelou de imediato [até pela sua larga experiência ao serviço do Crédito Agrícola] era a minha convicção de que o Grupo precisava de uma Caixa Central fortalecida. Para criar essa robustez, foi preciso, inicialmente, proceder a uma enorme limpeza de Balanço, o que fizemos com os próprios meios, sem recursos externos – ninguém nos veio ajudar [faz questão de frisar] foi a nossa gestão que tudo resolveu, com vista a criar uma Caixa Central sólida, desde logo em fundos próprios. Outra iniciativa muito bem- -sucedida envolveu a área comercial, que passou a ser coordenada centralmente, concentrando as actividades comerciais do Grupo: actividades de negócios de seguros (quer vida, quer ramos reais) e actividades bancárias (sejam elas também de investimento). A estratégia revelou-se um marco importante para o sucesso que veio a seguir. A promoção e o desenvolvimento do negócio das Caixas Agrícolas constituíram a essência do segundo mandato, sem esquecer, como é óbvio, o incremento do negócio da Caixa Central, numa lógica de coordenação centralizada, mas com responsabilidade local, plasmada na assinatura “Um Banco nacional com pronúncia local”. Fortalecidas as Caixas e a sua presença no mercado com o devido aporte – e suporte – tecnológico, a mudança operada nunca descurou as pessoas, num envolvimento exemplar. Com base nesse imperativo inadiável, conseguimos que as Administrações das Caixas, os nossos Colaboradores – a quem, repito, devo todo o sucesso do Grupo – se juntassem num propósito: “As Caixas Agrícolas são fundamentais para o desenvolvimento das economias locais e regionais”. Não há outro Banco, no País, que tenha essa responsabilidade. O Crédito Agrícola é, hoje, um património das comunidades locais. Esse sentimento de pertença não configura algo imaterial, é tangível nos ATM, nas Agências existentes nas mais recônditas localidades do Interior. As pessoas percepcionam esses equipamentos como sendo delas. E com toda a razão. Convirá assinalar que não temos accionistas, não trabalhamos para benefício de ninguém que não seja o proveito comum da sociedade. Obviamente sendo um Banco, temos de estar capitalizados e devidamente estruturados para fazer o que fazemos. Ainda no segundo mandato, conseguimos dar passos relevantes ao nível da gestão das CCAM, num percurso a que dei o nome de “A Profissionalização da Gestão das Caixas Agrícolas”. Essa meta seria cumprida no terceiro mandato, período condicionado pela pandemia, uma nova realidade, complexa e muito difícil. Mas, sendo característica do Grupo CA fazer das dificuldades oportunidades, o processo de transição digital acelerou de forma imparável, e os nossos quadros – ainda que em grande parte confinados – não deixaram de dar o melhor de si, para continuarmos a prestar um bom serviço aos Clientes, onde quer esteja o Crédito Agrícola.
Sem descaracterização da matriz...
Justamente. Adaptámo-nos aos novos tempos e sem que as pessoas, em momento algum, deixassem de contar connosco. É evidente que durante determinados períodos da pandemia tivemos de encerrar, temporariamente, algumas unidades de negócio e Agências [outrora designadas Balcões], mas sem pôr em causa o serviço prestado. Estivemos sempre presentes, jamais virando as costas às populações. Nós estamos com elas, e elas estão connosco, conferido sentido pleno aos verbos dar e receber. As pessoas, os nossos Clientes, têm sido inexcedíveis com o Crédito Agrícola. E nós só temos de retribuir para honrar essa confiança. Aí está, muito provavelmente, o motivo que nos permitiu, no terceiro mandato, alcançar o maior resultado de sempre do Grupo. Ao longo dos três mandatos anteriores, fomos crescendo sustentadamente, com muita dedicação e trabalho, colaboração efectiva e união de toda a equipa do Crédito Agrícola, sobretudo de quem está nas Caixas a dar o seu melhor todos os dias. Pessoalmente, admiro muito as pessoas que estão deslocadas nas Agências, muitas delas – volto a lembrar – isoladas no Interior...
Essa circunstância tão-pouco as impede de constituírem uma linha avançada, motivada, determinada...
De facto. Por isso, conhecem como ninguém quem vive e trabalha na região, a quem prestam um apoio que, tantas vezes, vai para além da esfera da actividade bancária. Reside aí a diferença, a grande diferença quando nos pomos a comparar... Nenhum outro Banco consegue o que nós conseguimos. Assim se percebe o porquê de a pessoas verem o Crédito Agrícola como património seu, o Banco que realmente lhes pertence.
Que compromissos estratégicos assumem especial relevância neste quarto mandato?
Encaro os próximos anos [até 2024] como um novo desafio. E sendo um desafio é também – passe o cliché – uma oportunidade. Entretanto, estão a conjugar-se vários factores que determinam algum movimento na gestão do Grupo, num registo bem diferente do que pontuou os mandatos anteriores. Refiro-me, entre outros, ao crescimento das taxas de juro e às dificuldades que algumas pessoas e várias empresas vão ter no cumprimento das suas obrigações; mas nós estamos cá, como é nosso timbre e cultura institucional, para as ajudar a superar as tormentas. Não será fácil, depois de muitos anos de taxas negativas ou muito baixas, e a maioria das pessoas fez uma acomodação de vida à luz dessa realidade. Por outro lado, também não era previsível que, passados dois anos de pandemia, tivesse aparecido um conflito armado com tanto impacto no nosso quotidiano, cujas consequências ninguém pode antecipar. Ainda sobre a inflação, os dois anos de COVID-19 apontavam já para uma subida, mas agora estima-se que cresça muito mais, até pelas previsões do Banco de Portugal. Esta curva ascendente é mensurável na vida de todos nós, no dia-a-dia das pessoas – basta ir abastecer o carro, fazer compras ao supermercado… Neste contexto de incerteza, as atenções e preocupações do Crédito Agrícola viram-se para os seus Clientes, mas igualmente para os seus Colaboradores, sendo crucial uma conjugação de esforços para os ajudarmos. Num quadro de melhoria de salários, é certo que os sindicatos fazem o seu legítimo trabalho, mas enquanto presidente desta Instituição, sou eu que tenho de me preocupar, primeiro que todos, com os nossos Colaboradores. Ao ser empossado presidente para o novo triénio, delineei como compromisso-chave acrescentar valor ao Grupo. Depois, precisamos de alterar a Lei que nos regula: o Regime Jurídico do Crédito Agrícola. No contexto político vigente, não há nenhuma razão impeditiva da actualização desse Regime. É certo que temos de entrar em diálogo com as autoridades, mas a alteração legislativa afigura-se inadiável. Essencialmente, para desobrigar a Caixa Central a reports individualizados, ao contrário do que é aceitável à luz da realidade actual do CA: reports do Grupo. Outra grande vertente está relacionada com o nosso capital humano, os Colaboradores. O mercado de trabalho mudou, o teletrabalho ganha cada vez mais espaço e dinâmica, além de as Caixas Agrícolas terem notória dificuldade no recrutamento local de pessoas com soft skills [ou competências adequadas], porque, após a Universidade, essas pessoas deixam os centros rurais; ainda assim, saudamos a existência dos Institutos Politécnicos, que tendem a fixar alguns potenciais profissionais, e onde nós vamos recrutar. Tenhamos presente que o mercado de trabalho já não é português – é global. A adaptação a esta nova era convoca os diferentes “actores”: sindicatos, trabalhadores, gestores – todos, sem excepção, porque não há retrocesso. Neste alinhamento programático, assumimos, sem reticências, os desafios que nos traz a questão da sustentabilidade ambiental, social e de governance [ESG]. No mercado português, somos um Banco que compara muito bem na área social, estamos a fazer um caminho muito positivo no domínio ambiental, mas não queremos ser green só porque sim, apenas para ficar bem na fotografia… Gostaria, mesmo muito, que no final deste mandato o Crédito Agrícola se afirme como referência nos três alicerces da sustentabilidade, mas uma referência com impacto substantivo.
Numa atitude permanente e natural, numa cidadania responsável, genuína, activa e começa cá dentro…
Isso mesmo. Alguém dizia há dias, num fórum de debate, que o pilar ambiental é uma questão de cidadania, pelo que cada cidadão tem de fazer por si e pelo futuro das novas gerações. Reconheço que estamos a fazer esse percurso, mas entendo que temos de fazer mais – muito mais. Tão importante como definir metas, aceitar desafios e atingir objectivos, é reflectirmos bem e interiorizarmos o tema em todos os patamares do universo CA; se assim não for, nada acontece. Neste desfiar de objectivos estratégicos, elegemos igualmente a digitalização enquanto vector crítico de sucesso num Banco com cultura de sustentabilidade como é o CA. Os jovens – reporto-me especialmente à Geração Z e às pessoas que, sendo mais velhas, estão alinhadas com as novas tecnologias – já não vão aos Balcões dos Bancos; eles querem acesso fácil e ágil ao Banco, em qualquer momento, estejam onde estiverem. No que toca à transição digital, e quase no imediato, vamos oferecer novos produtos nas nossas várias plataformas e aplicações – nas áreas dos seguros e do crédito, entre outras –, introduzindo, paulatinamente, mais funcionalidades no online, no mobile e no moey!. Outro desafio que o sistema bancário tem pela frente emerge das moedas digitais, que se perfilam como forte concorrente a muito breve prazo. O próprio regulador não esconde a sua natural preocupação, mas este é [mais] um processo sem retorno. Estou em crer que a evolução de muito Bancos, equipamentos e Balcões urbanos, se fará sem cash. Portanto, não estará longe a hora em que o dinheiro físico venha a ser coisa do passado. O futuro aponta nesse sentido, pelo que é preciso preparar o Crédito Agrícola para uma transição confortável, ou seja, sem impactos indesejáveis.
Depois de reconhecido pelo Revista The Banker, como o Banco com a melhor performance em Portugal, o CA registou em 2021, como já referiu, os seus melhores resultados de sempre. Que expectativas tem sobre as percepções resultantes desse desempenho histórico, considerando os stakeholders, o mercado financeiro e a economia portuguesa?
As percepções são muito importantes para qualquer Instituição e, naturalmente, convém que sejam positivas. Ao ter esse reconhecimento do Grupo Financial Times, em primeiro lugar é um grande orgulho, uma satisfação enorme para todos os que aqui trabalham no Crédito Agrícola, como para os nossos Clientes, ser sinalizado com relevância por uma entidade independente. Não fomos nós que o pedimos, nem nos pusemos em bicos de pés… O importante é que vimos somando exemplos da crescente notoriedade do Crédito Agrícola junto do mercado. Actualmente somos – das pequenas – a maior Instituição, supervisionada pelo Banco de Portugal [BdP]. Estando no topo, é natural que a observação e o escrutínio do que fazemos sejam objecto de atenções acrescidas, o que torna ainda mais exigente o nosso trabalho e a nossa gestão. Nesse pressuposto, a reputação que o Banco vai construindo tem de ser extremamente positiva.
Neste oscilante cenário global, consegue identificar os desafios maiores que se colocam à sua governance perante tantas incertezas?
Em 2013, o Crédito Agrícola não tinha 800 milhões de euros de fundos próprios, hoje estamos acima dos 2.000 milhões. Este é o nosso escudo protector, um lastro com espessura para enfrentar as dificuldades que possam surgir. Tenho muita confiança em todos nós. Como cidadão ocidental, não escondo a tristeza que me invade com as sucessivas imagens e relatos de atentados ao respeito pela dignidade da pessoa humana. Sinto-me muito tocado nos meus sentimentos. Era bom – muito bom – que a guerra tivesse um termo, que seja conseguido um rápido entendimento, porque, quanto ao resto, aos outros problemas, tudo se resolve. Mesmo com o crescimento das taxas de juro, com inflações altas, com custos de reconstrução de países destruídos – já nos deparámos com essas duras realidades, e creio bem que, mais uma vez, vamos ser capazes de superar os maiores obstáculos e continuar. Só a morte não tem solução, é irrecuperável; mas nós, os que ficarmos, nós que estamos na União Europeia, na Zona Euro, conseguiremos, juntos, ultrapassar todo este mar revolto.
Já aflorámos a questão, mas o que é que efectivamente mudou em termos de regulação face ao Crédito Agrícola?
Ao fit and proper transversal a todo o sistema bancário, ainda recai sobre nós uma exigência regulamentar que nos torna o Banco mais supervisionado pelo BdP. Aplicam-se requisitos, e em bom rigor o que legitimamente precisamos é de um novo regime jurídico consagrando um [só] report [e] para todo o Grupo CA; os dois reports actuais, com separação de águas, cria-nos manifestas dificuldades de gestão.
Que expectativas tem, por parte do regulador, susceptíveis de criar outra ‘moldura’ e amplitude ao Regime Jurídico do Crédito Agrícola?
Reitero o meu entendimento de que tudo se vai resolver, mais a mais quando o contexto político o permite. Os portugueses deram maioria a um partido e a um primeiro-ministro que escolheu o seu Governo. Inferimos desse voto de confiança que estão reunidas as condições necessárias para tomar quase todas as medidas – e não apenas as que envolvem o novo Regime Jurídico do Crédito Agrícola – cuja execução estava condicionada pelo anterior contexto político.
Que mensagem gostaria de deixar aos stakeholders ao assumir este seu quarto mandato?
Os Clientes, ou melhor, as populações dos territórios classificados como de baixa densidade, continuarão a contar com o CA. Estaremos sempre presentes, ao seu lado, seja com uma Agência, seja com um ATM, seja com qualquer outra ferramenta de apoio. Para além da nossa presença física, vamos incrementar o investimento no digital, para apoiar os jovens e as populações mais urbanizadas.